terça-feira, 24 de dezembro de 2013

BALDEAÇÃO IDEOLÓGICA INADVERTIDA DIÁLOGO , "TRECHOS E FRAGMENTOS"


                                                                BALDEAÇÃO IDEOLÓGICA INADVERTIDA DIÁLOGO  

                                                   
                                                                                 Dr Plinio Corrêa De Oliveira 

      “Na perspectiva desses princípios, o perigo comunista se apresenta para Plinio Corrêa de Oliveira como de natureza principalmente ideológica e moral. Sem negar a importância da agressão termonuclear, do terrorismo ou da guerrilha como meio de implantar o marxismo, Plinio Corrêa de Oliveira afirma entretanto que a ação ideológica sobre a opinião pública do Ocidente – enfraquecida pela corrupção e pela confusão – pode alcançar para a seita vermelha sucessos mais fáceis e menos arriscados.”


“Outra manobra é a apontada no presente ensaio de Plinio Corrêa de Oliveira: a da bolchevização inadvertida de incontáveis anticomunistas, por meio das palavras-talismã. A Editora Vera Cruz dá a lume a 5ª edição deste trabalho, que é um estudo do atualíssimo processo de persuasão ideológica subconsciente adotado pela propaganda comunista. O Autor analiza detidamente, a título de exemplo, a palavra-talismã “diálogo”.

 Trata-se de uma exposição feita com precisão de método, clareza de linguagem e rigor de observação, que descreve uma nova tática comunista que, colhendo de improviso a opinião ocidental, a pode arrastar para inesperadas negações e infortúnios insondáveis.

 Estamos certos de que este estudo interessa a um largo público, ávido de objetividade, de coerência e de coragem, e saciado do relativismo fácil, vazio e demolidor de nossos dias.”

“Torreão de vocábulos a serviço da propaganda comunista

 De há muito soavam falso a nossos ouvidos os múltiplos empregos que em certos meios vêm sendo dados à palavra “diálogo”. Em torno do eixo fixo de um significado residual legítimo, notávamos ser ela manipulada no linguajar quotidiano desses meios, e em certos comentários de imprensa, de modo tão forçado e artificial, com ousadias tão desconcertantes, e sentidos subjacentes tão vários, que sentíamos a necessidade, veemente como se fora um imperativo de consciência, de protestar contra essa transgressão das regras da boa linguagem.

 “Aos poucos, impressões, observações, notas colhidas aqui e acolá, iam criando em nossa mente a sensação de que essa multiforme torção da palavra “diálogo” tinha uma lógica interna que deixava ver algo de intencional, de planejado e de metódico. E que esse algo abrangia não só essa, mas outras palavras usuais nas elucubrações dos progressistas, socialistas e comunistas, como sejam “pacifismo”, “coexistência”, “ecumenismo”, “democracia-cristã”, “terceira-força”, etc. Tais vocábulos, uma vez submetidos a análoga torção, passavam a constituir como que uma constelação, em que uns apoiavam e completavam os outros. Cada palavra constituía um como que talismã a exercer sobre as pessoas um efeito psicológico próprio. E o conjunto dos efeitos dessa constelação de talismãs nos parecia de molde a operar nas almas uma transformação paulatina mas profunda.”

“Essa torção, segundo se nos tornava claro pela observação, se fazia sempre num mesmo sentido: o de debilitar nos não comunistas a resistência ao comunismo, inspirando-lhes um ânimo propenso à condescendência, à simpatia, à não-resistência e até ao entreguismo. Em casos extremos, a torção chegava até o ponto de transformar não comunistas em comunistas.

 E à medida que a observação nos ia fazendo vislumbrar uma linha de coerência nítida e uma lógica interna invariável no emprego variado e até desconcertante daquelas palavras eficazes e subtis como um talismã, ia-se-nos firmando no espírito a suspeita de que, se alguém chegasse a descobrir e a explicitar em que consiste essa linha de coerência ou essa lógica, teria desvendado um artifício novo e de grande envergadura, empregado pelo comunismo em sua incessante guerra psicológica contra os povos não comunistas.”

“É nota essencial e característica desse processo que, ao longo de toda ou quase toda sua extensão, os pacientes não percebem que estão sofrendo uma ação psicológica por parte de quem quer que seja, e nem que o rumo para o qual caminham suas impressões e suas simpatias é o comunismo. Eles têm consciência, com clareza maior ou menor conforme cada indivíduo, de que estão “evoluindo” ideologicamente”

“Em via de regra nem sequer passa pela mente desses pacientes, ao longo de quase todo o processo, que aos poucos se vão tornando comunistas. Se em determinado momento o risco disto se lhes tornasse notório, dar-se-iam conta, ipso facto, do abismo em que iam caindo, e retrocederiam.

  É só na etapa final da “evolução” que a evidência de sua transformação interior lhes faz ver que é para o comunismo que tendem. Entretanto, a essa altura sua mentalidade de tal maneira está “evoluída”, que a hipótese de se tornarem adeptos do comunismo já não lhes causa horror, mas antes simpatia.”

“Esse fenômeno – ou melhor, esse subtil processo da propaganda comunista – nós o denominamos aqui baldeação ideológica inadvertida. Propomo-nos a descrevê-lo sucintamente no que tem de essencial, e, como ele comporta diferentes modos de realização, estudá-lo-emos especialmente enquanto desenrolado através do que chamamos o estratagema da palavra-talismã. Em seguida, ilustraremos o estudo desse estratagema com um exemplo concreto, ou seja, com o emprego do termo “diálogo” para fazer evoluir inadvertidamente para o comunismo um número incontável de pessoas não comunistas”

“O fenômeno da baldeação ideológica inadvertida – bom é dizê-lo desde logo – comporta modalidades várias. Ele pode desenvolver-se em toda a sua amplitude e em seu sentido mais radical, isto é, pode levar o paciente até o fim do novo caminho, que é a aceitação do comunismo. O mesmo processo ocorrerá de modo menos amplo e radical, quando sua vítima, em lugar de se tornar comunista, ficar simplesmente socialista, por exemplo. Em um e outro caso, a baldeação é ideológica na força do termo. Pode ainda o fenômeno não dizer respeito propriamente a uma concepção filosófica do universo, da vida, do homem, da cultura, da economia, da sociologia e da política, como é o marxismo, mas somente a teorias e métodos de ação. Assim, um anticomunista fogoso pode ser “baldeado” para anticomunista adepto exclusivo das contemporizações, das concessões e dos recuos. É uma baldeação ideológica em um sentido diminutae rationis da palavra “ideológico”.”

“As técnicas de persuasão, mais importantes que a força

 A nosso ver, nas atuais condições, a persuasão ideológica não é considerada pelos comunistas como coisa colateral ou subsidiária em relação à investida violenta. Pelo contrário, esperam eles hoje em dia maiores resultados da propaganda do que da força.”

“Estas duas afirmações são indispensáveis para que muitos militantes do anticomunismo, que com zelo e com mérito se dedicam à tarefa indispensável de alertar o mundo para o perigo da guerra de conquista do comunismo, e da revolução social violenta, alarguem seus horizontes, e neles introduzam também a solicitude em denunciar, em prevenir e em sustar o processo de baldeação ideológica inadvertida, em suas várias formas, inclusive a da palavra-talismã.”

“ecumenismo, seita imperialista

 Para demonstrar as asserções que acabamos de fazer, é preciso ter em vista, antes de tudo, que o movimento comunista constitui fundamentalmente:

– uma seita filosofica atéia, materialista e hegeliana, a qual deduz dos seus errôneos princípios toda uma concepção peculiar do homem, da economia, da sociedade, da política, da cultura e da civilização;

– uma organização subversiva mundial: o comunismo não é apenas um movimento de caráter especulativo. Pelos imperativos de sua própria doutrina quer ele tornar comunistas todos os homens, e amoldar inteiramente segundo os seus princípios a vida de todos os povos. Considerada neste aspecto, a seita marxista professa o imperialismo integral, não só porque visa a imposição do pensamento e da vontade de uma minoria a todos os homens, mas ainda porque essa imposição atinge o homem todo, em todas as manifestações de sua atividade.”

“A saída do impasse não podendo estar para o comunismo nem na violência nem na persuasão explícita só pode estar numa nova via: a da persuasão implícita. Este é o ponto central para onde é preciso chamar insistentemente a atenção da opinião pública.”

“binômio medo-simpatia

 Como vemos, há na própria psicologia de incontáveis pessoas no Ocidente um binômio de forças, que chamaremos de medo-simpatia, o qual inspira em influentes setores econômicos, políticos, intelectuais e até religiosos a propensão para entrar em composição com o comunismo”

“Simplesmente, não é mais dos partidos comunistas existentes nos países livres, mas sim da técnica de persuasão implícita, que o comunismo espera a conquista da opinião pública mundial.”

“Os matizes da opinião pública e a baldeação ideológica inadvertida”

“Quanto aos elementos categoricamente hostis ao comunismo e não raro até militantes contra ele, cumpre alvejá-los com uma ofensiva psicológica total que vise desorganizá-los, desanimá-los e reduzi-los à inação. Para isto, é especialmente útil agir contra os líderes anticomunistas. É preciso que se sintam espionados fora e até dentro de suas organizações, rodeados de traidores, divididos entre si, incompreendidos, difamados e isolados dos outros setores da opinião, afastados das posições-chave do país, e dos meios de publicidade, e de tal maneira perseguidos em suas atividades profissionais, que, bastando-lhes apenas o tempo para prover à própria subsistência, se vejam o quanto possível impedidos de atuar seriamente contra o marxismo.”

“As ameaças de vingança pessoal contra eles e suas famílias também são utilizadas não raras vezes, pelo comunismo, para impedir a ação desses bravos.”

“Quanto aos elementos indiferentes ao problema comunista, antipáticos ao comunismo em graus diversos, mas que não chegam à hostilidade militante, são eles, por assim dizer, a maioria dentro da maioria. A esses, já que se mostram refratários a toda técnica de persuasão explícita, só existe para o comunismo um meio de atrair. É a técnica de persuasão implícita. Como é natural, para operar esta última, o partido comunista não pode mostrar-se. Ele deve escolher agentes de aparência não comunista, ou até anticomunista, que atuem nos mais diversos setores do corpo social. Quanto mais insuspeitos de comunismo parecerem, tanto mais eficazes serão. No plano da ação individual, por exemplo, um grande capitalista, um político burguês proeminente, um aristocrata ou um clérigo serão para isto de muito maior eficiência do que um pequeno burguês ou um operário.”

“Sobre este setor da opinião pública, muito podem em favor do comunismo os partidos políticos, os jornais e os outros meios de publicidade que, aparentando todas as garantias de não serem comunistas, entretanto não vêem na luta contra a seita vermelha uma necessidade contínua e de capital importância nos dias que correm.

 Uns e outros – isto é, pessoas, partidos políticos, órgãos de publicidade –prestam ao comunismo um primeiro e precioso concurso, pelo simples fato de entreterem no setor em questão um clima de superficialidade de espírito, bem como de otimismo fácil e despreocupado no que diz respeito à ameaça comunista. Pois assim as organizações anticomunistas ficam implicitamente vistas como apaixonadas e exageradas pela maior parte da opinião pública, que normalmente poderia e deveria dar-lhes apoio. E de outro lado se impede que nessa maioria, advertida da gravidade hodierna do perigo, os indiferentes passem à antipatia contra o comunismo, e os anticomunistas não militantes entrem na luta.

 Ambos estes frutos são preciosos para o marxismo, pois lhe evitam um grande mal. Enquanto ele recruta à vontade seus quadros de militantes, penetra e articula as organizações de inocentes-úteis, e executa contra a sociedade, auxiliado por estes elementos, sua faina destruidora contínua e inexorável, a maior parte da opinião pública, que reagiria se tivesse consciência da real gravidade do perigo, fecha os olhos para ele, cruza os braços, e deixa livre curso ao adversário.”

“A técnica de persuasão implícita mais apropriada para o estado de espírito em que se encontra a maioria é a baldeação ideológica inadvertida."

“O método da baldeação ideológica inadvertida: suas três intensidades e suas três fases”

“Comporta esse método uma primeira fase, de caráter todo preparatório, consistente em atuar por meio do binômio medo-simpatia no sentido de dispor a uma atitude inerte e até resignada ante os progressos do comunismo setores de opinião que à vista desses progressos seriam propensos a se alarmar e a reagir. Dessa fase tratamos no capítulo anterior (item 9). Nela a baldeação ideológica inadvertida alcança o mínimo de sua intensidade.

 Esta atinge um grau a mais na fase seguinte. Sem o perceber, o paciente da baldeação, seja ele um indivíduo, um grupo restrito, ou uma grande corrente de opinião, passa da resignação para uma atitude de expectativa já algum tanto favorável. O fruto do processo já não é negativo e preparatório, mas tem algo de positivo.


Por fim, quando logra transformar o simpatizante em adepto convicto, a baldeação chega à sua plena intensidade e produz seu fruto característico.”

“Na sua essência, o processo da baldeação ideológica inadvertida consiste em atuar sobre o espírito de outrem, levando-o a mudar de ideologia sem que o perceba”

“Para chegar a esse resultado, é possível lançar mão de artifícios diversos.

"O mais das vezes, esses artifícios se reduzem ao seguinte”

“a – encontrar no sistema ideológico atualmente aceito pelo paciente pontos de afinidade com o sistema ideológico para o qual se deseja baldeá-lo;

 * b – supervalorizar doutrinária e sobretudo passionalmente esses pontos de afinidade, de tal maneira que o paciente acabe por colocá-los acima de todos os outros valores ideológicos que admite;

 * c – atenuar tanto quanto possível, na mentalidade do paciente, a adesão aos princípios doutrinários que atualmente aceita e que sejam inconciliáveis com a ideologia para a qual se quer baldeá-lo;

 * d – despertar nele a simpatia pelos militantes e líderes da corrente ideológica para a qual será baldeado, fazendo-o ver neles soldados dos princípios supervalorizados conforme o exposto no item “b”;

 * e – dessa simpatia passar à cooperação para fins comuns ao paciente e seus adversários doutrinários de ontem, ou quiçá para o combate a uma ideologia ou uma corrente, inimiga tanto daquele quanto destes;

 * f – daí conduzir o paciente à convicção de que os princípios supervalorizados são mais consentâneos com a ideologia de seus novos cooperadores e irmãos de luta do que com a sua ideologia de ontem;

“g – a esta altura, a mentalidade do paciente estará mudada, e sua assimilação à nova ideologia não encontrará senão obstáculos secundários.”

“Ao longo de quase toda essa trajetória, ele não se dará conta de que está mudando de idéias. E, quando disto se der conta, já não se assustará com o fato. De princípio a fim, imaginará estar agindo por movimento próprio, e não advertirá que está sendo manobrado. O processo é, pois, inadvertido de dois pontos de vista:

 – porque o paciente durante quase toda a baldeação não a percebe;

 – porque ele não nota que essa baldeação é um fenômeno produzido nele por terceiro.

 Por esta forma, o adversário se transforma gradualmente em simpatizante e por fim em adepto.”

“Da exacerbação do apetite de igualdade – tão fácil dada a tendência do homem para a inveja e a revolta – resultam logicamente o ódio de toda hierarquia social e econômica, e o igualitarismo total, inerente ao regime comunista já desde a fase do capitalismo de Estado e da ditadura do proletariado.

 Uma vez exacerbada a idéia de fraternidade, se chega ao ódio de tudo quanto separa e diferencia proporcionada e legitimamente os homens, e, pois, ao anseio da abolição de todas as pátrias, para a instauração de uma república universal: outro objetivo do comunismo.”

“Sob a louvável alegação de destruir privilégios e desigualdades excessivas, pode-se ir além, e abolir, gradualmente, também privilégios legítimos e desigualdades indispensáveis à dignidade da pessoa humana e ao bem comum. À medida que o rolo compressor do igualitarismo se for tornando assim mais pesado e mais destrutivo, através das reformas socialistas e igualitárias – a reforma agrária, a reforma urbana, a reforma da empresa comercial e industrial (5) – toda a sociedade se irá avizinhando do ideal comunista. E na proporção em que com isto se habituar a opinião pública, também ela se irá tornando comunista”

“Nova, sobretudo, é a baldeação ideológica inadvertida enquanto, de colateral que era, se tornou preponderante na tática usada pelo comunismo com vistas à conquista ideológica do mundo (7).”

“As declarações anticomunistas de alguns de seus líderes não provam que as transformações por eles impostas não são comunistas nem tendem para o comunismo. Pois o caráter comunista de uma transformação decorre da natureza desta, e não do rótulo que lhe dão os políticos que a levam a cabo.

Do mesmo modo, as reformas de Nasser não deixaram de ser muito avançadamente socialistas pelo simples fato de que no Egito está proscrito o partido comunista. Seria muito infantil quem daí deduzisse que aquele país está caminhando para rumos opostos aos do comunismo.”

Palavra Talismã
“Consiste ele, essencialmente, em empregar com uma técnica muito ardilosa certos vocábulos mais ou menos elásticos, próprios para se atuar de modo muito sui generis sobre a mente de indivíduos, grupos ou grandes coletividades.”

“Nessa posição inicial, em que o paciente, mercê da unilateralidade de seu estado de espírito, já aparece preparado para a ação psicológica que vai sofrer, o emprego de uma palavra bem escolhida pode produzir efeitos surpreendentes. É a palavra-talismã.

 Trata-se de uma palavra cujo sentido legítimo é simpático e por vezes até nobre; comporta ela, porém, certa elasticidade. Empregando-se tal palavra tendenciosamente, começa ela a refulgir para o paciente com brilho novo, que o fascina e o leva muito mais longe do que poderia pensar.

 Citemos alguns desses sadios e até nobres vocábulos. Torcidos, atormentados, deturpados, violentados, de vários modos, a quanto equívoco, a quanto erro, a quanto desacerto têm eles servido de rótulo! Pode-se mesmo dizer que os efeitos dessa técnica são tanto mais nocivos quanto mais digno e elevado é o conteúdo da palavra de que assim se abusa: “corruptio optimi pessima”. Entre as palavras portadoras de um conteúdo digno, assim transformadas em enganosos talismãs a serviço do erro, podem ser citadas: justiça social, ecumenismo, diálogo, paz, irenismo, coexistência, etc.”

“Esse dom publicitário da palavra-talismã conduz o escritor, o orador, o conferencista à tentação de usá-la com crescente frequência, a todo propósito, e até fora de propósito. Pois assim lograrão mais facilmente fazer-se aplaudir. E, para multiplicar as oportunidades de empregar tal palavra, eles a vão utilizando em sentidos analógicos sucessivamente mais arrojados, aos quais a elasticidade natural dela se presta quase até o absurdo.”

“A radicalização da palavra-talismã vai de per si operando a baldeação ideológica inadvertida, nos que a empregam. Pois, presos ao fascínio do vocábulo, vão eles aceitando sem mais, como ideais supremos e ardentemente professados, os significados sucessivamente mais radicais que ele vai assumindo.

 Pari passu, esses ideais, com a força dos valores aceitos como supremos, vão produzindo no paciente da baldeação todas as mudanças de atitude interior e exterior em relação ao adversário da véspera, que descrevemos no capítulo anterior (item 4).

 É assim que a palavra-talismã serve para desencadear e conduzir a termo o processo da baldeação ideológica inadvertida.”

“A palavra-talismã radicalizada reluta em explicitar seu sentido. Com efeito, sua grande força está na emoção que provoca. A explicitação, atraindo para ela a atenção analítica de quem a usa ou de quem a ouve, perturbaria e impediria ipso facto a fruição sensível e imaginativa do vocábulo. A palavra-talismã, mantendo assim obstinadamente implícito seu significado, continua a ser veículo e esconderijo do seu crescente conteúdo emocional”

“A ação da palavra-talismã pode, pois, ser “exorcizada” mediante sua explicitacão. É a conseqüência do que acabamos de dizer. Compreende-se assim a utilidade do presente trabalho, que visa por à disposição dos interessados o meio de sustar, pela “exorcização” da palavra-talismã, o processo de baldeação ideológica inadvertida.”

“As indicações sumárias que acabamos de fazer parecerão talvez por demais abstratas. Por isto, no presente capítulo, exempleficaremos como se empregam as palavras-talismã, analisando como uma delas, a palavra “diálogo”, é utilizada para promover a baldeação ideológica inadvertida para o relativismo hegeliano e para o marxismo.”

“Analisando os significados correntes da palavra que ora nos ocupa, como aliás também de outras que com ela têm certa conexão, como “dialética”, “discussão”, “polêmica”, etc., podemos verificar que se lhes atribuem significações muito diversas e às vezes até, de certo ponto de vista, contraditórias. E isso se dá tanto nos meios cultos, quanto nos de instrução mediana ou baixa. Com o passar dos anos, a carga emocional que se anexou a algumas dessas palavras veio a lhes alterar o sentido, fazendo com que pessoas de gerações diferentes as entendam de modos também diferentes. De região para região do Brasil, e com mais razão de país para país, se manifestam por vezes variações sensíveis.”

“Todas estas considerações fazem ver que a discussão pura e simples corresponde a necessidades naturais e profundas do convívio humano. E que proscrevê-la para reduzir as formas deste convívio ao mero diálogo em sentido estrito (ou à discussão-diálogo) seria artificialidade grave e perigosa.”

“Como se sabe, nada prejudica mais a verdadeira paz, que é a tranqüilidade da ordem (cf. Santo Agostinho, De Civ. Dei, XIX, c. 13), do que o se apagarem entre os homens a verdade e o bem, fundamentos únicos dessa mesma ordem. Quem nega a liceidade da discussão pura e simples, imaginando talvez trabalhar para a concórdia, implanta de fato o reino da discórdia.”

“Apresentar a discussão pura e simples, por medida de prudência, como sempre ilícita, sempre perigosa, sempre nociva às almas, constitui verdadeira escamoteação doutrinária.”

“Por análogo motivo, também, a polêmica, quando boa, tem em grau excelso todas as qualidades inerentes à discussão pura e simples bem conduzida”

“Assim, as correntes de opinião se defrontam e se exprimem como que em diversas gamas, e, travadas pelos grandes, as discussões e as polêmicas por sua vez repercutem sobre os pequenos novamente, os inspiram e orientam.

 Na sua forma mais ilustre, e historicamente mais importante, a discussão pura e simples e a polêmica se encetam, se desenvolvem e se desfecham aos olhos de multidões sobre as quais exercem uma ação rectrix do maior alcance. E em função dessas multidões alcançam sua plena dimensão.”

“Assim, as correntes de opinião se defrontam e se exprimem como que em diversas gamas, e, travadas pelos grandes, as discussões e as polêmicas por sua vez repercutem sobre os pequenos novamente, os inspiram e orientam.

“Esse relativismo total é mais negativo do que afirmativo. Ele nega todos os outros sistemas, porém ainda não oferece uma concepção positiva do homem, da vida e do universo. O impulso irenístico não se poderia contentar com isto. Tendendo a chegar, por seu natural dinamismo, ao extremo de si mesmo, ele toma o caráter hegeliano. Ou seja, concebe a marcha do pensamento, e aliás também a da História, como movida pela eterna fricção de doutrinas ou de forças ao mesmo tempo relativamente verdadeiras e relativamente falsas. Dessa fricção da tese com a antítese nasceria por via de superação uma nova “verdade” relativa, a qual por sua vez entraria em fricção com outra, dando origem a mais uma síntese, e assim por diante, indefinidamente. – Este o termo final do longo itinerário que, iniciado no simples irenismo, levando esse mesmo irenismo de requinte em requinte, chega ao relativismo e por fim ao hegelianismo.”

“para o utopista a vida não possa ter normalmente um sentido legítimo de luta, de prova e de expiação, mas só de paz macia e regalada. Ele é, assim, e por definição, pacifista “à outrance”, ultra-ecumênico, ultra-irênico. E nenhum de seus sonhos teria coerência interna, nenhum seria capaz de o satisfazer inteiramente, se não incluísse a supressão de todas as lutas e de todas as controvérsias.”

"Por seu lado, como vê o burguês mundano a perspectiva de um paraíso operário? Habituado a seus bens, deles não quer abrir mão. Entretanto, extenuado pela luta de classes, com medo das perspectivas de guerras, revoluções, saques e morticínios, horas há em que lhe sorri como mal menor a possibilidade de se integrar pacificamente, e salvando quiçá algumas pequenas vantagens, no paraíso proletário. E depois, pensa ele, quem sabe se esse paraíso consegue, ao contrário da sociedade burguesa, eliminar o erro, o mal e a dor? Compensaria talvez renunciar às vantagens de que ora desfruto, reflete ainda o burguês mundano, para entrar em um mundo onde ninguém estivesse sujeito a esse tríplice jugo. Ninguém... nem ele próprio que, nos intervalos entre seus negócios e seus prazeres, se sente tão vulnerável pela doença e pelos riscos de toda ordem.”

“E então, com todo o ímpeto de sua apetência de um paraíso na terra, o burguês mundano começa a descobrir em si uma fibra socialista e a entrever possibilidades de pacto com o comunismo. Surge nele um sentimento pacifista em relação a este terrível adversário. O diálogo irênico lhe sorri… A par do medo, começa a atuar nele a simpatia.”

“Mas os dirigentes comunistas mundiais estão longe de ignorar o estado emocional em que atualmente se encontram tantos e tantos burgueses mundanos.

Esse estado é eminentemente explorável em favor do comunismo pelo binomio medo-simpatia. Com isto fica o burguês mundano preparado para a baldeação ideológica, que o levará – como veremos – através da palavra “diálogo”, repetida sob mil e mil formas, a se tornar comunista sem o perceber, ou pelo menos a adotar em face do comunismo posições entreguistas que abrirão a este as portas da cidadela.”


“B. Multiplicidade de efeitos da palavra-talismã

 A palavra-talismã “diálogo” é tão rica em efeitos, que, para os estudarmos adequadamente, devemos classificá-los em dois grupos:

– os efeitos diretos, por ela produzidos sobre a mentalidade das pessoas a quem fascina;

– um processo pelo qual a mentalidade assim transformada e a palavra-talismã “diálogo”, radicalizando-se mutuamente e servindo-se do diálogo como instrumento, conduzem os “dialogantes” ao relativismo hegeliano.”

“Primeiro efeito – O diálogo resolve tudo

 Sobre o irenista preparado como mostramos acima (item A), começa a agir a palavra-talismã. Falaram-lhe de diálogo. Segundo observa, esse termo é empregado em um sentido novo e muito especial, só indiretamente relacionado com o significado corrente. A palavra “diálogo” reluz assim a seus olhos com um conteúdo que tem algo de moderno e elegante. As pessoas em evidência a utilizam como se fosse uma fórmula nova para mudar convicções, simples, irresistível. Não dialogar é proceder de maneira retrógrada no campo ideológico, em plena era atômica. Dialogar é estar em dia, é assinalar-se como eficiente e moderno. E o irenista se põe então a pensar: o diálogo resolve todos os problemas. Nada de discussões, nem de polêmicas; é preciso unicamente dialogar com os que pensam de outra maneira, sejam eles até comunistas. O diálogo, pela afabilidade que o caracteriza, tem o condão de desarmar todas as prevenções. Ele assegura a quem o usa a glória de persuadir todos os opositores.”

Primeiro efeito – O diálogo resolve tudo

“Segundo efeito – Uma constelação de impressões e emoções unilaterais”

“Terceiro efeito – Simpatia e notoriedade decorrentes da ressonância publicitária da palavra “diálogo”

“Quarto efeito – Desperta-se a miragem da era da boa vontade”

“Quinto efeito – A propensão a abusar da elasticidade da palavra “diálogo”

“Este fato, em via de regra, o explorador da palavra-talismã – como aliás também o público – o sentirá sem o poder explicitar. Em conseqüência, será levado a preferir umas aplicações dela a outras. E, se tiver algum talento, irá forçando a natural elasticidade do vocábulo, de maneira a multiplicar os empregos mais fascinantes e rendosos.”

“Em conseqüência dessas disposições emocionais, cada uma delas é conduzida a achar que a outra está sempre de boa fé. O êxito de seu esforço de persuasão lhe parece depender apenas da eliminação de ressentimentos da outra”

“Esta última deturpa, em conseqüência, o sentido da discussão-diálogo, sobrevalorizando a nota de cordialidade, e subestimando a de pugnacidade. Acentua-se então a deturpação inicial do estilo de relações entre as partes.

 A discussão-diálogo já não visa principalmente obter a verdade, e só por meio dela a unidade. Mas visa sobretudo a unidade por meio da cordialidade de relações entre os interlocutores. E só secundariamente a conquista da verdade através da argumentação.”

“Nesta última, ele visará principalmente a unidade, e apenas secundariamente a verdade.

 A esse tipo de discussão, ele chamará de diálogo, para insinuar que é tão despido de pugnacidade como o diálogo-investigação ou o diálogo-entretenimento.”

“A partir do relativismo, a verdadeira discussão é impossível; quando tratam da matéria até aqui controvertida, os interlocutores, pelo próprio fato de o fazerem sob o signo do relativismo, já não estão procedendo a uma autêntica discussão”

“Cada vez mais próxima do mito da era da boa vontade, ela se torna sempre mais aliciante e refulgente para os irenistas relativistas. Ela comunica ardências sempre maiores à apetência de unidade, e prepara assim a fase seguinte.”

“Começa a lhe parecer agora que são inconsistentes as divergências doutrinárias, que na fase anterior já ele tanto subestimara em benefício dos pontos de convergência. Em todas elas, põe-se a ver vislumbres de verdade e de erro de parte a parte. As diferenças estariam mais nas fórmulas do que no conteúdo. Em última análise, uma mesma “verdade” global, toda ela relativa, e presente residualmente nas mais opostas formulações, seria o substrato de uma realidade vária, e indefinidamente mutável.”

“A verdade, já anteriormente aceita como algo de relativo, passa a ser vista nesta fase como o produto de uma eterna dialética.”

“Depois de ter assumido o caráter de mero entretenimento e investigação, o diálogo começa a ser praticado como um “ludus” no qual ambas as partes admitem que, à força de dialogar, se operará entre elas uma decantação da verdade, como pela fricção da tese e da antítese se chega à síntese. Nasce assim o último estágio da deturpação talismânica da palavra “diálogo”. É o estágio hegeliano. É bem de se ver que, atuada assim por homens de boa vontade, impregnada do mito irenístico, a fricção da tese com a antítese será fundamentalmente um “ludus” cordial. E tanto mais cordial quanto mais se vá desenrolando em lances sucessivos.

 A fricção entre a tese e a antítese poderá assumir por vezes a forma da discussão pura e simples ou até da polêmica. Não lhes terá a substância, pois não pressupõe um antagonismo absoluto entre a verdade e o erro, entre o bem e o mal”

“Da fricção das “verdades” relativas opostas, nasceria por via de superação uma síntese, e da universal fricção das teses e das antíteses, gerando sempre sínteses que por novas fricções com formulações antitéticas dariam em novas sínteses, se originaria um grandioso processo de universal destilação das “verdades”, e da “verdade”.”

“Se considerarmos sumariamente os elementos principais do que ficou exposto neste trabalho, a conclusão emergirá com clareza e facilidade: o comunismo é o grande beneficiário da baldeação ideológica inadvertida e do emprego das palavras-talismã, especialmente da palavra-talismã “diálogo”.

Igualmente se patenteará que essa imensa manobra comunista é susceptível de ser inutilizada pelo simples fato de que alguém a desvende aos olhos da opinião pública.”

“Como se sabe, o marxismo, abandonando embora o caráter idealista do hegelianismo, conservou-lhe a essência dialética. A marcha ascensional da evolução da matéria se opera, segundo Marx, através da tese, da antítese e da síntese, tal como para Hegel se dava a evolução do espírito”

“Essa preparação para o comunismo, operada pela palavra-talismã “diálogo”, na realidade concreta só excepcionalmente redundará em mera preparação. A afinidade produz a simpatia, e a simpatia inclina à adesão. Esta adesão é tanto mais fácil, quanto a opinião pública contemporânea está saturada por um onímodo e inteligente sistema de incitamentos e atrações a favor do comunismo.”

“Visto assim, o ecumenismo é uma imensa preparação de todas as religiões, feita através do diálogo hegeliano, para, uma vez unificadas, entrarem em ulterior diálogo com a antítese comunista.”

“O fato de o comunismo aceitar a coexistência pacífica com as várias religiões que se lhe opõem, indica porventura estar encerrado o período das perseguições religiosas?

 Em rigor de lógica, não. O comunismo admitirá tal coexistência com as religiões ou os grupos religiosos que, colocando-se em posição hegeliana, aquiesçam em com ele dialogar numa base relativista. Nisto sua atitude parece nova, porém a novidade se nos afigura não estar nele, senão em certas correntes religiosas cuja posição em face do relativismo se vai tornando cada vez mais débil e conivente. O comunismo perseguia as religiões quando elas o combatiam. É coerente, de sua parte, deixar de combater aquelas que se mostram dispostas a entabular com ele o diálogo relativista em um clima de coexistência pacífica.”

“os vocábulos “diálogo” e “coexistência” formam com a palavra “paz” um só anel. A paz irênica não se reduz à mera inexistência de guerras termonucleares ou convencionais, de revoluções ou guerrilhas. Ela contém uma doutrina, ela é um estilo de vida não só pública como privada, em que todos os elementos de atrito foram substituídos por uma coexistência cordial e dialética da tese com a antítese, numa contínua colaboração para preparar a síntese.”

“Diálogo”, “coexistência”, “paz”, enquanto vocábulos-talismã, são usados aqui e acolá em acepções por vezes enigmáticas. Mas, se interpretados em um sentido evolucionista e hegeliano, o cunho enigmático se dissipa, e esses termos talismânicos passam a ser claros, de contornos precisos, e perfeitamente congruentes entre si.

 Isto nos põe em presença, já agora, da ação baldeadora não de uma só palavra, “diálogo”, mas de toda uma constelação de palavras-talismã afins.”

“Por oposição à chamada via russa (isto é, a via de luta ideológica e perseguição policial, seguida de modo quase contínuo na Rússia), se delineia assim uma via italiana, inspirada pelo senso oportunista do comunismo, e formulada em termos de irenismo, diálogo relativista e coexistência.”


“Para a maior parte das pessoas, o mito, lembrado e insinuado na palavra “diálogo”, e cuja sedução é a como que eletricidade de que esta se acha carregada, só é atraente quando se mantém impreciso, difuso, envolto nas névoas da poesia. Como é belo sonhar vagamente com uma concórdia definitiva e completa em todos os campos em que os homens tenham relações entre si! Explicitar esse sonho, procurar estudá-lo, seria matá-lo (cf. cap. III, 3). E ademais, para que explicitar? Para que entender? Mitos assim são muito menos feitos para serem compreendidos do que degustados. O fumante de ópio em geral não se interessa pela composição química deste. Ele não quer entender mas sentir o ópio.”

“E assim, mesmo quando se obstina em permanecer implícito, o mito pode ser detectado, caracterizado e por fim posto a nu por um observador ciente das regras próprias a esse labor.”

“Uma vez posto a nu o mito pelo observador, pode este, divulgando seu achado, “exorcizar” a palavra-talismã. Pois, explicitando o mito, proporcionará ele aos pacientes da baldeação ideológica inadvertida os meios para abrirem os olhos à ação que sobre eles se exerce, para se darem conta dos rumos aos quais ela conduz, e para se defenderem contra ela.”

“Explicitado o mito, estará anulado o quebranto. A natural repulsa ao comunismo, das pessoas assim alertadas, agirá então, e a manobra comunista ficará frustrada.

 Contribuir para dar às vítimas desse processo o meio de defesa eficaz, é o objetivo com que este trabalho foi escrito.”

Trecho de: Unknown. “Dialogo.” iBooks. 
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sábado, 21 de dezembro de 2013

O CAMINHO DA SERVIDÃO Trechos e Fragmentos



O CAMINHO DA SERVIDÃO 
Trechos e Fragmentos
Trecho de: Hayek, F. A. “O Caminho da Servidão.



“Se, a longo prazo, somos os criadores do nosso destino, de imediato somos escravos das idéias que criamos. Somente reconhecendo o perigo a tempo poderemos ter esperança de evitá-lo.”

“É porque quase todos o desejam que estamos marchando nessa direção. Não há nenhum fato objetivo que torne essa marcha inevitável. Mais tarde, teremos alguma coisa a dizer sobre a pretensa inevitabilidade da "planificação". A questão principal está em saber aonde esse movimento nos levará. Se as pessoas cujas convicções lhes emprestam agora um impulso irresistível começarem a ver o que apenas uns poucos já compreenderam, não será possível que recuem horrorizadas e abandonem o propósito em que durante meio século tanta gente de boa vontade se tem empenhado? Saber onde nos levarão essas idéias comuns à nossa geração é problema não para um partido mas para cada um de nós - e problema da mais importante significação. Poder-se-á imaginar maior tragédia do que, no esforço de modelar conscientemente o nosso futuro de acordo com elevados ideais, estarmos de fato e involuntariamente produzindo o oposto daquilo por que vimos lutando?”

“Chega-se a ter a impressão de que não desejamos compreender a seqüência dos fatos que produziram o totalitarismo porque tal compreensão poderia destruir algumas das mais caras ilusões a que nos apegamos.”

“Contudo, a história destes países nos anos anteriores ao surgimento do sistema totalitário apresentava poucos aspectos estranhos à nossa”

“Contudo, a história destes países nos anos anteriores ao surgimento do sistema totalitário apresentava poucos aspectos estranhos à nossa”

“A tendência moderna ao socialismo não implica apenas um rompimento definitivo com o passado recente, mas com toda a evolução da civilização ocidental, e isso se torna claro quando o consideramos não só em relação ao século XIX, mas numa perspectiva histórica mais ampla. Estamos rapidamente abandonando não só as idéias de Cobden e Bright, de Adam Smith e Hume, ou mesmo de Locke e Milton, mas também uma das características mais importantes da civilização ocidental que evoluiu a partir dos fundamentos lançados pelo cristianismo e pelos gregos e romanos. Renunciamos progressivamente não só ao liberalismo dos séculos XVIII e XIX, mas ao individualismo essencial que herdamos de Erasmo e Montagne, de Cícero e Tácito, de Péricles e Tucídides.”

“O fato de que este novo rumo tomado com tanta esperança e ambição nos fizesse deparar com o horror do totalitarismo representou um profundo choque para esta geração, que se recusa ainda a relacionar uma coisa à outra. Contudo, este desdobramento apenas confirma as advertências dos fundadores da filosofia liberal que ainda professamos. Fomos aos poucos abandonando aquela liberdade de ação econômica sem a qual a liberdade política e social jamais existiu."

"O princípio fundamental segundo o qual devemos utilizar ao máximo as forças espontâneas da sociedade e recorrer o menos possível à coerção pode ter uma infinita variedade de aplicações.”


“A GRANDE UTOPIA O que sempre fez do Estado um verdadeiro inferno foram justamente as tentativas de torná-lo um paraíso."
“O aspecto trágico do pensamento coletivista é que, ao tentar tornar a razão a instância suprema, acaba destruindo-a por interpretar de forma errônea o processo do qual depende o desenvolvimento dessa mesma razão. Pode-se dizer, com efeito, que o paradoxo das doutrinas coletivistas, e de sua exigência de controle e planejamento "consciente", reside no fato de que elas levam' inevitavelmente à necessidade de que a mente de um indivíduo venha a exercer o domínio supremo - enquanto a atitude individualista em face dos fenômenos sociais é a única que nos permite reconhecer as forças supra-individuais que regem a evolução da razão. O individualismo é, assim, uma atitude de humildade diante desse processo social e de tolerância para com as opiniões alheias, sendo a negação perfeita da arrogância intelectual implícita na idéia de que o processo social deva ser submetido a um amplo dirigismo.”

“Peter Drucker ( The End of Economic Man, p. 74) observa com razão que "quanto menos liberdade Há, mais ouvimos falar em 'nova liberdade'. Todavia, essa nova liberdade é uma simples palavra com que se encobre a negação completa de tudo quanto a Europa já entendeu por liberdade. ...A nova liberdade que se prega na Europa rcsume-se, entretanto, no direito da maioria contra o indivíduo".”

“A democracia amplia a esfera da liberdade individual [dizia ele em 1848], o socialismo a restringe. A democracia atribui a cada homem o valor máximo; o socialismo faz de cada homem um mero agente, um simples número. Democracia e socialismo nada têm em comum exceto uma palavra: igualdade. Mas observe-se a diferença: enquanto a democracia procura a igualdade na liberdade, o socialismo procura a igualdade na repressão e na servidão”

“socialismo equivale à abolição da iniciativa privada e da propriedade privada dos meios de produção, e à criação de um sistema de "economia planificada" no qual o empresário que trabalha visando ao lucro é substituído por um órgão central de planejamento.”

“Também não devemos esquecer que o socialismo não é apenas a espécie mais importante de coletivismo ou de "planificação"; é também a doutrina que persuadiu inúmeras pessoas de tendências liberais a se submeterem mais uma vez ao rígido controle da vida econômica que haviam abolido, pois, segundo Adam Smith, tal controle faz com que os governos, "para se manterem, sejam obrigados a tornar-se opressores e tirânicos".

“O que nossos planejadores exigem é um controle centralizado de toda a atividade econômica de acordo com um plano único, que estabeleça a maneira pela qual os recursos da sociedade sejam "conscientemente dirigidos" a fim de servir, de uma forma definida, a finalidades determinadas.”

“Em primeiro lugar, é necessário que os agentes, no mercado, tenham liberdade para vender e comprar a qualquer preço que encontre um interessado na transação, e que todos sejam livres para produzir, vender e comprar qualquer coisa que possa ser produzida ou vendida. E é essencial que o acesso às diferentes ocupações seja facultado a todos, e que a lei não tolere que indivíduos ou grupos tentem restringir esse acesso pelo uso aberto (58) ou disfarçado da força.”

“o surgimento de cartéis e sindicatos tem sido deliberadamente promovido desde 1878 pela política governamental. Não só o protecionismo mas também estímulos diretos, e por fim a coação, foram empregados pelos governos para favorecer a criação de monopólios, visando ao controle de preços e vendas. Foi lá que, com a ajuda do Estado, a primeira grande experiência de "planejamento científico" e "organização consciente da indústria" fez surgir monopólios gigantes"
“É justamente essa a função que o sistema de preços desempenha no regime de concorrência, e que nenhum outro sistema sequer promete realizar. Ele permite aos empresários ajustar sua atividade à de seus concidadãos pela (observação das oscilações de um certo número de preços, tal como o maquinista dirige o trem observando alguns mostradores. É importante assinalar que o sistema de preços só cumprirá sua função se a concorrência predominar, ou seja, se o (68) produtor tiver que se adaptar às alterações de preços e não puder controlá-las. Quanto mais complexo o todo, mais dependemos da divisão de conhecimentos entre indivíduos cujos esforços separados são coordenados pelo mecanismo impessoal, transmissor dessas importantes informações, que denominamos sistema de preços.”

“Entre o idealista dedicado e o fanático, muitas vezes há apenas um passo. Embora o ressentimento do especialista frustrado constitua o mais poderoso estímulo à reivindicação de planejamento central, è difícil imaginar um mundo mais intolerável -
e também mais irracional - do que aquele em que se permitisse aos mais eminentes especialistas de cada campo proceder sem entraves à realização dos seus ideais.”

“O "objetivo social" ou o "propósito comum" para o qual se pretende organizar a sociedade costuma ser vagamente definido como o "bem comum", o "bem-estar geral" ou o "interesse comum". Não é necessário muito esforço para se perceber que esses termos não estão suficientemente definidos para determinar uma linha específica de ação. O bem-estar è a felicidade de milhões não podem ser aferidos numa escala única de valores”

“É esse reconhecimento do indivíduo como juiz supremo dos próprios objetivos, é a convicção de que suas idéias deveriam governar-lhe tanto quanto possível a conduta que constitui a essência da visão individualista.”

“Infelizmente não é possível estender de modo contínuo a esfera da ação comum sem reduzir ao mesmo tempo a liberdade do indivíduo em sua própria esfera. Quando o setor público, em que o Estado controla todos os meios, excede certa parte do todo, os efeitos de suas ações dominam o sistema inteiro. Embora o Estado só controle diretamente o uso de uma grande parte dos recursos disponíveis, os efeitos de suas decisões sobre a parte restante do sistema econômico se tornam tão acentuados que, de forma indireta, ele passa a controlar quase tudo”
“O clamor por um ditador econômico é um estágio característico da tendência ao planejamento, já familiar neste país”

“Mas numa sociedade cujo funcionamento está subordinado ao planejamento central não se pode fazer com que esse controle dependa da possibilidade de um acordo de maioria; muitas vezes será necessário impor ao povo a vontade de uma pequena minoria, porque esta constitui o grupo mais numeroso capaz de chegar a um acordo sobre a questão em debate”

“Se na acepção dessas pessoas "capitalismo" significa um sistema de concorrência baseado no direito de dispor livremente da propriedade privada, é muito mais importante compreender que só no âmbito de tal sistema a democracia se torna possível. No momento em que for dominada por uma doutrina coletivista, a democracia destruirá a si mesma, inevitavelmente.”

“Não queremos dizer, contudo, que a ditadura leva inevitavelmente à abolição da liberdade, e sim que a planificação conduz à ditadura porque esta é o instrumento mais eficaz de coerção e de imposição de ideais, sendo, pois, essencial para que o planejamento em larga escala se torne possível. O conflito entre planificação e democracia decorre, simplesmente, do fato de que esta constitui um obstáculo à supressão da liberdade exigida pelo dirigismo econômico. Mas, ainda que a democracia deixe de ser uma garantia da liberdade individual, mesmo assim ela pode subsistir de algum modo num regime totalitário. Guardando embora a forma democrática, uma verdadeira "ditadura do proletariado" que dirigisse de maneira centralizada o sistema econômico provavelmente destruiria a liberdade pessoal de modo tão definitivo quanto qualquer autocracia.”

“Daí o conhecido fato de que, quanto mais o Estado ''planeja", mais difícil se torna para o indivíduo traçar seus próprios planos.”

“Mas chamar de privilégio a propriedade privada como tal, que todos podem adquirir segundo as mesmas normas, só porque alguns conseguem adquirí-la e outros não - é destituir a palavra privilégio do seu significado”

“A lei pode tornar legal aquilo que para todos os efeitos permanece uma ação arbitrária e, para possibilitar a gestão central das atividades econômicas, é-lhe necessário fazer isso. Se a lei declara que uma autoridade ou comissão podem agir da maneira que lhes convém, todas as ações destas serão legais - mas não estarão por certo sujeitas ao Estado de Direito. Conferindo-se ao governo poderes ilimitados, pode-se legalizar a mais arbitrária das normas; e desse modo a democracia pode estabelecer o mais completo despotismo.”

“O Estado de Direito implica, pois, uma limitação do campo legislativo: restringe-o às normas gerais conhecidas como Direito formal e exclui toda legislação que vise diretamente a determinados indivíduos, ou a investir alguém do uso do poder coercitivo do Estado tendo em vista tal discriminação. Ele não significa que tudo é regulado pela lei mas, ao contrário, que o poder coercitivo do Estado só pode ser usado em casos por esta definidos de antemão, e de tal maneira que se possa prever o modo como será usado. Qualquer lei aprovada pelo Parlamento pode, assim, infringir o Estado de Direito”

“Mas é fácil perceber que, seja qual for a sua forma, tais limitações dos poderes de legislar envolvem o reconhecimento do inalienável direito do indivíduo, dos invioláveis direitos do homem.”

“Nesse particular, são muito mais coerentes os numerosos reformadores que, desde o início do movimento socialista, atacaram a idéia "metafísica" dos direitos individuais, insistindo em que num mundo racionalmente organizado o indivíduo não terá direitos, mas apenas deveres. Esta se tornou, na verdade, a atitude mais comum dos chamados progressistas; e nunca alguém se expõe tanto ao risco de ser tachado de reacionário como quando protesta contra uma medida alegando que ela constitui violação dos direitos individuais”

“O controle da produção da riqueza é o controle da própria existência humana.
Hilaire Belloc”

“A maioria dos planejadores que analisaram em profundidade os aspectos práticos de sua tarefa está certa de que uma economia dirigida deve seguir linhas mais ou menos ditatoriais. Para ser submetido a um controle consciente, o complexo sistema de atividades interrelacionadas que constitui uma economia terá de ser dirigido por uma única equipe de especialistas, devendo a responsabilidade e o poder últimos ficar a cargo de um chefe supremo, cujos atos não poderão ser tolhidos pelos processos democráticos. Essas são conseqüências demasiado óbvias das idéias em que se baseia o planejamento central, razão por que não poderiam deixar de conquistar o consenso da maioria dos adeptos da planificação”

“Ter as nossas atividades econômicas controladas significa ser controlados sempre, a menos que declaremos em cada caso o nosso propósito específico. Mas como cada declaração de propósito dependeria de aprovação de autoridade, todos os nossos atos seriam realmente controlados.”

“Planejamento central significa que o problema econômico será resolvido pela comunidade e não pelo indivíduo; isso, porém, implica que caberá à comunidade, ou melhor, aos seus representantes,, decidir sobre a importância relativa das diferentes necessidades.”

“o planejamento econômico importaria o controle da quase totalidade da nossa vida. Não existiria praticamente nenhum aspecto desta - desde as necessidades primárias até as relações de família e de amizade, da natureza do nosso trabalho até o uso que fazemos de lazer - sobre o qual o planejador não exercesse seu "controle consciente”

“Já não defendem a planificação por sua produtividade superior, mas porque nos permitirá realizar uma distribuição da riqueza mais justa e eqüitativa. Este é, com efeito, o único argumento em seu favor digno de debate. Não há dúvida alguma de que, se quisermos assegurar uma distribuição da riqueza segundo um padrão predeterminado, se quisermos estabelecer conscientemente o que caberá a cada um, teremos de planifícar todo o sistema econômico. Resta saber se o preço que teríamos de pagar pela realização desse ideal de justiça não seria um descontentamento e uma opressão |maiores do que os jamais causados pelo livre jogo das forças econômicas, alvo de tão severas críticas.”

“Mas, como resultado, a substituição da concorrência pelo planejamento central exigiria um controle muito maior sobre a nossa vida do que até hoje foi tentado. Essa ingerência não poderia limitar-se àquilo que consideramos nossas atividades econômicas, porque hoje dependemos em quase tudo das atividades econômicas dos nossos semelhantes.”

“Nossa geração esqueceu que o sistema de propriedade privada é a mais importante garantia da liberdade, não só para os proprietários mas também para os que não o são. Ninguém dispõe de poder absoluto sobre nós, e, como indivíduos, podemos escolher o sentido de nossa vida - isso porque o controle dos meios de produção se acha dividido entre muitas pessoas que agem de modo independente. Se todos os meios de produção pertencessem a uma única entidade, fosse ela a "sociedade" como um todo ou um ditador, quem exercesse esse controle teria poder absoluto sobre nós.”


“Creio ter sido o próprio Lênin que introduziu na Rússia a famosa expressão "quem, a quem?", com a qual nos primeiros anos do regime soviético o povo sintetizava o problema universal de uma sociedade socialista.4 Quem planeja a vida de quem? Quem dirige e domina a quem? Quem determina a posição do indivíduo durante sua existência e quem tem o que lhe cabe determinado por outrem? Estas se tornam as questões essenciais, que só podem ser decididas pelo poder supremo.”

“Isso não é um simples jogo de palavras. Estamos tratando de uma questão crucial que a semelhança dos termos tende a ocultar. Embora o consenso em torno da igualdade completa solucionasse todos os problemas de mérito que o planejador tem de resolver, a opção por uma igualdade maior não soluciona quase nenhum. Seu teor não vai muito além de expressões vagas como "o bem comum" ou "o bem-estar social”

“A este respeito, hoje não é menos válido o que John Stuart Mill escreveu há quase um século: Poder-se-ia admitir uma regra fixa, como a da igualdade, ou a sorte ou uma necessidade externa; mas seria intolerável que um punhado de seres humanos pesasse todos na balança, dando mais a este e menos àquele a seu bel-prazer ou segundo o próprio critério de julgamento, a não ser que se tratasse de indivíduos considerados super-homens e apoiados em poderes sobrenaturais.”

“O planejamento bem-sucedido exige a criação de uma opinião comum sobre os valores essenciais; é por isso que a restrição da nossa liberdade no que diz respeito às coisas materiais atinge de modo tão direto nossa liberdade espiritual.”

“De fato, os socialistas foram em toda parte os primeiros a reconhecer que a tarefa por eles assumida exigia a aceitação generalizada de uma Weltanschauung ( N. do T.: literalmente, "visão de mundo"), comum de um conjunto definido de valores.”

“O problema, todavia, muda de caráter à medida que, na marcha progressiva para o socialismo, evidencia-se para o indivíduo que sua renda, e de um modo geral sua posição, são determinadas pelo mecanismo coercitivo do Estado e que ele só pode manter ou melhorar essa posição como membro de um grupo organizado capaz de influenciar ou controlar a máquina estatal.”

“Num país em que o único
empregador é o Estado, oposição
significa morte lenta por inanição.
O velho princípio "quem não
trabalha não come" foi substituído
por outro: "quem não obedece não
come".
Leon Trotsky (1937)”

“Com efeito, quando a segurança é entendida num sentido absoluto, o empenho geral em conquistá-la, ao invés de possibilitar maior liberdade, torna-se a mais grave ameaça a esta.”

“Benjamin Franklin expressou numa frase aplicável a todos nós como indivíduos não menos que como nações: "Aqueles que se dispõem a renunciar à liberdade essencial em troca de uma pequena segurança temporária não merecem liberdade nem segurança".”

“ POR QUE OS PIORES CHEGAM AO PODER
Todo poder corrompe, e o poder absoluto corrompe de maneira absoluta.
Lord Acton”

“homens inescrupulosos têm mais probabilidades de êxito numa sociedade que tende ao totalitarismo. Quem não percebe essa verdade ainda não mediu toda a vastidão do abismo que separa o totalitarismo dos regimes liberais, a profunda diferença entre a atmosfera moral do coletivismo e a civilização ocidental, essencialmente individualista.”

“Se a "comunidade" ou o Estado têm prioridade sobre os indivíduos, se possuem objetivos próprios superiores aos destes e deles independentes, só os indivíduos que trabalham para tais objetivos podem ser considerados membros da comunidade.”


“Como conseqüência necessária dessa perspectiva, uma pessoa só é respeitada na qualidade de membro do grupo, isto é, apenas se coopera para os objetivos comuns reconhecidos, e toda a sua dignidade deriva dessa cooperação, e não da sua condição de ser humano”

“Isto permanece válido ainda que muitos socialistas liberais orientem suas ações pela desastrosa ilusão de que, privando os indivíduos do poder que possuem num sistema individualista e transferindo-o à sociedade, lograrão acabar com o próprio poder. O que todos aqueles que usam esse argumento esquecem é que, concentrando-se o poder de modo a empregá-lo a serviço de um plano único, ele não será apenas transferido mas aumentado a um grau infinito; e que, enfeixando-se nas mãos de um só grupo uma autoridade antes exercida por muitos de forma independente, cria-se um poder infinitamente maior - tão amplo que quase chega a tornar-se um outro gênero de poder.”

“substituição do poder econômico pelo político", tão demandada hoje em dia, significa necessariamente a substituição de um poder sempre limitado por um outro ao qual ninguém pode escapar. Embora possa constituir um instrumento de coerção, o chamado poder econômico nunca se torna, nas mãos de particulares, um poder exclusivo ou completo, jamais se converte em poder sobre todos os aspectos da vida de outrem. No entanto, centralizado como instrumento do poder político, cria um grau de dependência que mal se distingue da escravidão.”

“Na ética individualista, o princípio de que o fim justifica os meios é considerado a negação de toda a moral. Na ética coletivista, torna-se (142) a regra suprema; não há literalmente nada que o coletivista coerente não deva estar pronto a fazer, desde que contribua para o "bem da comunidade", porque o "bem da comunidade" é para ele o único critério que justifica a ação. A "razão de Estado", em que a ética coletivista encontrou a sua formulação mais explícita, não conhece outros limites que não os da conveniência - a adequação do ato particular ao objetivo que se tem em vista. E o que a "razão de Estado" afirma no tocante às relações entre diferentes países aplica-se também às relações entre diferentes indivíduos no Estado coletivista. Não pode haver limites para aquilo que o cidadão desse Estado deve estar pronto a fazer, nenhum ato que a consciência o impeça de praticar, desde que seja necessário à consecução de um objetivo que a comunidade impôs a si mesma ou que os superiores lhe ordenem.”

“Uma vez admitido que o indivíduo é simples instrumento para servir aos fins da entidade superior que se chama sociedade ou nação, manifesta-se necessariamente a maior parte dessas características dos regimes totalitários que nos enchem de horror. Da perspectiva coletivista, a intolerância e a brutal supressão da dissidência, o completo desrespeito pela vida e pela felicidade do indivíduo são conseqüências essenciais e inevitáveis dessa premissa básica. O coletivista pode aceitar esse lato, e ao mesmo tempo afirmar que seu sistema é superior àqueles em que se permite que interesses individuais "egoístas" criem embaraços à plena realização das metas visadas pela comunidade. Quando os filósofos alemães (144) repetidas vezes caracterizam como imoral em si mesma a busca da felicidade pessoal e apenas digno de louvor o cumprimento do dever imposto, estão usando de completa sinceridade, por mais incompreensível que isso pareça às pessoas educadas numa tradição diferente.”
“O FIM DA VERDADE
É significativo que em todos os
países a estatização do pensamento
tenha sempre caminhado pari passu
com a estatização da indústria.
E. H. Carr”

“ Embora seja necessário escolher as idéias e impô-las ao povo, elas devem converter-se nas idéias do povo, num credo aceito por todos que leve os indivíduos, tanto quanto possível, a agir espontaneamente do modo desejado pelo planejador. Se o sentimento de opressão nos países totalitários é, em geral, bem menos agudo do que muitos imaginam nos países liberais, é porque os governos totalitários conseguem em grande parte fazer o povo pensar como eles querem. Isto, evidentemente, é realizado pelas várias formas de propaganda”

“único ponto a salientar é que nem a propaganda em si nem as técnicas empregadas são peculiares ao totalitarismo; o que altera de forma tão abrangente sua natureza e efeitos num Estado totalitário é o fato de que a propaganda visa a um único alvo: todos os instrumentos de propaganda são coordenados de modo a conduzir os indivíduos na mesma direção e a produzir a característica Gleichschaltung (N. do R. Literalmente,
"padronização") de todas as mentes”

“E a técnica mais eficiente para a consecução desse fim é continuar a usar as velhas palavras, alterando-lhes, porém, o sentido. Poucos aspectos dos regimes totalitários despertam tanta confusão no observador superficial e são, ao mesmo tempo, tão característicos do clima intelectual desses sistemas, como a completa perversão da linguagem, a mudança de sentido das palavras que expressam os ideais dos novos regimes.”

“E a confusão agrava-se ainda mais porque essa alteração do sentido das palavras que definem ideais políticos não é um fato isolado mas um processo contínuo, uma técnica empregada consciente ou inconscientemente com o fim de dirigir o povo. Pouco a pouco, à medida que o processo se desenrola, toda a linguagem é por assim dizer esvaziada, e as palavras são despojadas de qualquer significado preciso, podendo designar tanto uma coisa como o seu oposto e sendo usadas apenas por causa das conotações emocionais que ainda lhes estão vinculadas.”

“Assim, os fatos e as teorias tornam-se objeto de uma doutrina oficial, na mesma medida em que as opiniões sobre valores. Todo o arsenal educativo - as escolas e a imprensa, o rádio e o cinema será empregado exclusivamente para disseminar as idéias, verdadeiras ou falsas, que fortaleçam a crença na justeza das decisões tomadas pela autoridade; e toda informação que possa causar dúvidas ou hesitações será suprimida. O provável efeito sobre a lealdade do povo ao sistema torna-se o único critério para resolver se determinada informação deve ser publicada ou não. A situação num Estado totalitário é, permanentemente, e em todos os campos, a mesma de qualquer outro país, com relação a determinados assuntos, em tempo de guerra.”

“Não há, pois, campo algum em que não se pratique o controle sistemático das informações e em que a uniformidade de pontos de vista não seja imposta.”

“Os social-democratas, com o auxílio desse sufrágio [universal], ocuparam todos os postos que podiam obter no Reichstag, no Parlamento, nos Conselhos Municipais, na Justiça do Trabalho, nos institutos de previdência social, e assim por diante. Desse modo, penetraram fundo no organismo do Estado. Mas o preço disso foi que o Estado, por sua vez, passou a exercer grande influência sobre as classes trabalhadoras. Sem dúvida, como resultado do árduo esforço desenvolvido pelos socialistas durante cinqüenta anos, o Estado já não é o mesmo de 1867, quando foi implantado o sufrágio universal; mas, por sua vez, a social-democracia já não é a mesma daquela época. O Estado passou por um processo de socialização e a social-democracia sofreu um processo de estatização.”

“OS TOTALITÁRIOS EM NOSSO MEIO
Quando a autoridade se apresenta
disfarçada em organização,
aumenta de tal modo o seu fascínio
que pode levar nações livres a
converter-se em Estados
totalitários.
The Times”

“É de notar que o dogma segundo o qual a história obedece a leis científicas é pregado sobretudo pelos partidários da autoridade arbitrária. Isso é muito natural, pois elimina as duas realidades mais odiadas por eles, isto é, a liberdade humana e a ação histórica do indivíduo”

“planejamento" em grande escala. Embora não seja tão franco em seu desprezo pela liberdade quanto Crowther, o Dr. Waddington não é muito mais encorajador do que ele. Difere da maior parte dos escritores do mesmo gênero pelo fato de perceber com clareza e até enfatizar que as tendências por ele descritas e defendidas conduzem inevitavelmente a um sistema totalitário”

“Um Estado que permite concentrações tão imensas de poder não pode consentir que este repouse inteiramente no controle privado. Também não é menos ilusório supor que em tais condições os empresários possam gozar por muito tempo da situação especial de que desfrutam numa sociedade baseada na concorrência justificável pelo fato de que, embora a probabilidade de sucesso leve muitos a se arriscar, apenas alguns são bem-sucedidos. Não surpreende que os empresários desejem gozar, não apenas da elevada renda que o regime de concorrência possibilita aos vencedores, mas também da (178) segurança do funcionário público. Enquanto um vasto setor da indústria privada coexistir com a indústria dirigida pelo governo, um empresário de talento poderá conquistar salários elevados, mesmo em posições bastante seguras. Embora, porém, seja possível aos diretores de grandes empresas verem suas esperanças realizadas durante uma fase de transição, não tardarão a verificar, como seus colegas alemães, que já não são senhores, tendo, antes de contentar-se em todos os aspectos com os poderes e emolumentos que o governo lhes conceder”

“Quando, porém, se trata de muitas indústrias monopólicas, é preferível deixá-las nas mãos de indivíduos diferentes a reuni-las sob o controle único do Estado. Ainda que as estradas de ferro, os transportes terrestres e aéreos ou o abastecimento de gás e eletricidade fossem necessariamente monopólios, a posição do consumidor seria sem dúvida mais forte enquanto tais setores continuassem constituindo monopólios separados, do que se fossem "coordenados" por um controle central.”

“O mecanismo do monopólio se identificaria com o mecanismo do Estado e este, por sua vez, se aliaria cada vez mais aos interesses dos dirigentes, em prejuízo dos interesses do povo em geral.”

“Não há outra alternativa: ou a ordem estabelecida pela disciplina impessoal do mercado, ou a ordem comandada pelo arbítrio de alguns indivíduos; e aqueles que se empenham em destruir a primeira estão ajudando, consciente ou inconscientemente, a criar a segunda. Mesmo que nessa nova ordem alguns trabalhadores passem a se alimentar melhor e (o que é indubitável) todos passem a se vestir de maneira mais uniforme, é lícito duvidar que a maioria dos trabalhadores ingleses fique agradecida aos seus líderes intelectuais por a terem presenteado (181) com uma doutrina socialista que ameace a sua liberdade pessoal.”

“Enganam-se, porém, quando levam mais longe a comparação, afirmando que devemos aprender a dominar as forças da sociedade da mesma forma que aprendemos a dominar as forças da natureza. Esse é o caminho não só do totalitarismo mas também da destruição da nossa civilização e um meio certo de obstar o progresso futuro.”

“Aqueles que reivindicam tal domínio das forças sociais mostram não terem ainda compreendido até que ponto a simples preservação do que até agora conquistamos depende da coordenação dos esforços individuais por forças impessoais.”

“Voltaremos agora por alguns momentos ao ponto crucial: a liberdade individual é inconciliável com a supremacia de um objetivo único ao qual a sociedade inteira tenha de ser subordinada de uma forma completa e permanente. A única exceção à regra de que uma sociedade livre não deve ser submetida a uma finalidade exclusiva é constituída pela guerra e por outras calamidades temporárias, ocasiões em que a subordinação de quase tudo à necessidade imediata e (187) premente é o preço que temos de pagar pela preservação, a longo prazo, da nossa liberdade. Isso explica também por que são tão errôneas muitas idéias hoje em moda, segundo as quais devemos aplicar aos fins da paz os processos que aprendemos a empregar para fins de guerra. Ê sensato sacrificar temporariamente a liberdade de modo a garanti-la para o futuro; não se pode dizer, porém, o mesmo de um sistema proposto como solução permanente.”

“Nunca se deveria esquecer que o fator decisivo do advento do totalitarismo no Continente, fator que ainda inexiste neste país, foi o surgimento de uma classe média despojada de seus bens.”


“Nossas esperanças de evitar o destino que nos ameaça devem, com efeito, repousar em grande parte na perspectiva da retomada de um progresso econômico acelerado que nos faça ascender continuamente por mais baixo que tenhamos de começar”

“Há claros indícios de que nos tornamos, na realidade, mais tolerantes para com determinados abusos e muito mais indiferentes perante as desigualdades em casos individuais, depois que voltamos nossa atenção para um sistema inteiramente novo, em que o Estado resolverá todas as questões. É bem possível mesmo, como se tem sugerido, que a paixão pela ação coletiva seja um meio pelo qual, coletivamente e sem remorso, passamos a satisfazer o egoísmo que, como indivíduos, tínhamos aprendido, em parte, a reprimir.”

“É verdade que as virtudes menos estimadas e praticadas hoje em dia - a independência, a confiança em si mesmo e a disposição para assumir riscos, para defender as convicções pessoais contra a maioria e para cooperar voluntariamente com os nossos semelhantes -são as principais virtudes em que repousa uma sociedade individualista. O coletivismo não tem como substituí-las, e na medida em que as destruiu deixou um vácuo que não é preenchido senão pela exigência de submissão e pela coerção do indivíduo para que faça o que a coletividade declara justo”

“que não é possível fazer omeletes sem quebrar ovos, notamos que os ovos quebrados nesse processo são sempre aqueles que, uma ou duas gerações atrás, eram considerados as bases essenciais da vida civilizada”

“As virtudes nas quais em geral se admitia que esse povo superava os demais, com exceção de algumas nações pequenas, como os suíços e os holandeses, eram a independência e a fé em si mesmo, a iniciativa individual e a responsabilidade pela solução de problemas em nível local, a justificada confiança na atividade voluntária, a não-interferência nos assuntos dos vizinhos e a tolerância para com os excêntricos e os originais, o respeito pelo costume e pela tradição e uma saudável desconfiança do poder e da autoridade.”

“Pois a experiência os fez mais prudentes: aprenderam que nem as boas intenções nem a eficiência da organização podem preservar a decência num sistema em que a liberdade e a responsabilidade pessoal são destruídas”

“De todas as restrições à
democracia, a federação tem sido a
mais eficaz c a que mais favorece a
harmonia. ...O sistema federativo
limita e restringe o poder
soberano, dividindo-o e concedendo
ao governo apenas certos direitos
definidos. É o único meio de
refrear, não só a maioria, mas o
poder do povo inteiro.
Lord Acton”

“Muitas formas de planejamento econômico só são praticáveis, com efeito, quando a autoridade planejadora está em condições de afastar todas as influências externas. O resultado inevitável de tal planejamento é, em conseqüência, o acúmulo de restrições ao movimento de pessoas e mercadorias”

“Aqueles que compreendem ao menos em parte essas ameaças costumam chegar à conclusão de que o planejamento econômico se deve realizar em nível "internacional", isto é, deve ser feito por alguma autoridade supranacional. Mas, conquanto isso pudesse afastar alguns dos perigos óbvios criados pelo planejamento em escala nacional, parece que os defensores de planos tão ambiciosos têm pouca noção das dificuldades e perigos ainda maiores suscitados por suas propostas. Os problemas decorrentes da ordenação deliberada dos assuntos econômicos em escala nacional assumem inevitavelmente proporções maiores quando a mesma coisa é levada a efeito em escala internacional. O conflito entre planificação e liberdade não pode deixar de agravar-se à medida que diminui a semelhança de valores e de padrões entre os que são submetidos a um plano unitário. Não é muito difícil planejar a vida econômica de uma família, e a dificuldade é pouco maior quando se trata de uma comunidade pequena. Mas à proporção que a escala aumenta, diminui o (199) consenso a respeito da ordem de importância dos objetivos“Numa pequena comunidade, os padrões de valores e as opiniões sobre a importância relativa das tarefas principais serão comuns no que diz respeito a um grande número de questões. Este número, porém, diminuirá cada vez mais à medida que se amplia o âmbito de planificação; e, diminuindo o consenso, crescerá a necessidade de adotar a força e a coerção.”

“o planejamento realizado em escala internacional não pode ser senão a lei da força: a imposição, por parte de um reduzido grupo, do tipo de trabalho e do padrão de vida que os planejadores julgam convir aos demais”

“Mas é impossível ser justo e permitir que cada um viva a seu modo quando a autoridade central distribui matérias-primas e aloca mercados, quando todo esforço espontâneo depende de uma "aprovação'' e nada se pode fazer sem a sanção da autoridade central.”

“os povos assentissem em delegar tais poderes a uma autoridade (205) internacional, não tardariam a descobrir que o que tinham delegado não era uma simples tarefa técnica e sim o mais amplo controle sobre suas próprias vidas.”

“É significativo que os mais apaixonados defensores de uma Nova Ordem para a Europa, com direção econômica centralizada, revelem, como os seus protótipos fabianos e alemães, o mais completo desdém pela individualidade e pelos direitos das pequenas nações”

“É significativo que os mais apaixonados defensores de uma Nova Ordem para a Europa, com direção econômica centralizada, revelem, como os seus protótipos fabianos e alemães, o mais completo desdém pela individualidade e pelos direitos das pequenas nações”

“A forma de governo internacional sob a qual certos poderes estritamente definidos são transferidos a uma autoridade superior, enquanto sob todos os outros aspectos cada país permanece responsável pela sua política interna é, naturalmente, a da federação. Não devemos permitir que os numerosos argumentos irrefletidos, e muitas vezes tolos, apresentados em favor de uma "União Federal" durante o apogeu da propaganda nesse sentido, obscureçam o fato de que o princípio federativo é a única forma de associação de povos diferentes capaz de criar uma ordem internacional sem restringir de maneira indevida o desejo de independência desses povos.7 O federalismo nada mais é do que a aplicação, aos assuntos internacionais, da democracia, único método de mudança pacífica até hoje inventado pelo homem. Trata-se, porém, de uma democracia com poderes claramente limitados. Além do ideal mais impraticável que visa a fundir diferentes países num único Estado centralizado (cuja conveniência, aliás, está longe de ser evidente), a federação é o único meio de converter em realidade o ideal do Direito internacional. Não devemos iludir-nos: no passado, ao denominar Direito internacional as regras de conduta entre as nações, estávamos apenas manifestando (207) uma aspiração hipócrita. "

“Quando queremos impedir que as pessoas se matem umas às outras, não nos contentamos em declarar em público que o homicídio é condenável: conferimos poder a uma autoridade para impedi-lo. Do mesmo modo, não haverá Direito internacional se não existir um poder que o aplique.”

“Uma autoridade internacional que limite de modo efetivo o poder do Estado sobre o indivíduo será uma das melhores salvaguardas da paz. O Estado de Direito internacional deve tornar-se uma proteção tanto contra a tirania do Estado sobre o indivíduo, como contra a (209) tirania do novo super-estado sobre as comunidades nacionais. Nossa meta não deve ser nem um superestado onipotente, nem uma frouxa associação indefinida de "nações livres", mas uma comunidade de nações formadas de homens livres. Durante muito tempo, afirmamos que se tornara impossível adotar aos negócios internacionais uma linha de ação que nos parecia aconselhável, porque os outros recusavam entrar no jogo. O acordo a ser estabelecido constituirá uma oportunidade de mostrarmos que fomos sinceros e que estamos prontos a aceitar as mesmas restrições à nossa liberdade de ação que, no interesse comum, achamos necessário impor aos outros.”

“Agora, é mais importante remover os obstáculos com que a insensatez humana obstruiu o nosso caminho e liberar a energia criadora dos indivíduos, do que inventar novos mecanismos para "guiá-los" e "dirigi-los" -criar condições favoráveis ao progresso, ao invés de
"planejar o progresso”

“Se fracassamos na primeira tentativa de criar um mundo de homens livres, devemos tentar novamente. O princípio orientador - o de que uma política de liberdade para o indivíduo é a única política que de fato conduz ao progresso permanece tão verdadeiro hoje como o foi no século XIX.”

“Talvez os estudos mais esclarecedores sobre alguns de nossos problemas contemporâneos ainda se encontrem em certas obras dos grandes filósofos políticos da era liberal, como De Tocqueville ou Lorde Acton, e, para ir ainda mais longe no passado, Benjamin Constant, Edmund Burke e os ensaios reunidos em The Federalist de Madison, Hamilton e Jay - homens de gerações para as quais a liberdade ainda constituía um problema e um valor a ser defendido, enquanto a nossa geração, que a encara como algo que sempre continuará existindo, não sabe de onde vêm os perigos que a ameaçam nem tem a coragem de livrar-se das doutrinas que a ela se opõem.”


Trecho de: Hayek, F. A. “O Caminho da Servidão.” OrdemLivre.org, 2012-05-09T16:24:50+00:00. iBooks. 
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